A literatura infantil, com ar acadêmico
O Estado de São Paulo / Jornal da Tarde, 03/04/1987
Tatiana Belinky
A inclusão de Literatura lnfantil/Juvenil no currículo de diversas faculdades de letras produziu teses de mestrado e até de doutorado, sem falar nos cursos avulsos, congressos, encontros, seminários, debates e outros eventos, que por sua vez resultaram em boa quantidade de livros: teses publicadas, estudos, ensaios, reflexões – superficiais ou eruditos, “acadêmicos” ou “populares”, uns mais “arejados”, outros mais “ideologizados”, uns bons, outros nem tanto – diversos dos quais já comentados nesta coluna, que hoje traz mais três: Livro que te Quero Livre (título muito adequado), de Sueli Cagneti e Werner Zotz, Ed. Nórdica. Não se trata, como pode parecer, de um texto “a quatro mãos”, mas sim de dois textos independentes num mesmo volume, que vai bem recomendado: acaba de ganhar o Prêmio da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes) para 1986, da categoria “Estudo sobre Literatura Infantil”.
A primeira parte do livro é uma “entrevista” com Werner Zotz, “montada” a partir de entrevistas e conversas, gravadas e publicadas, do consagrado autor, entre muitos outros, do premiadíssimo e popularíssimo Apenas um Curumim. Ninguém mais brasileiro que este catarinense de nome alemão – para quem “é mais fácil viver no exílio que abdicar da nossa língua” – professor, jornalista, publicitário, mas principalmente, há mais de vinte anos, escritor que se preocupa com a criança, o jovem, a arte, e o estar-no-inundo dentro da ética, da poesia e da beleza. No texto, sintomaticamente intitulado “A Revolução pelo Prazer”, Werner Zotz faz ouvir a sua voz de humanista, autor que curte e compreende a criança e o jovem, com a sabedoria do homem maduro – crítico e sensível, moderno e aberto, “revolucionário” e sensato: um artista e um educador, que o leitor descobrirá por si mesmo, ao tomar conhecimento, de modo fácil e agradável, das posições e opiniões deste escritor que nunca perdeu a juventude interior.
A segunda parte do livro, da também catarinense professora de língua e literatura Sueli de Souza Cagneti, sob o título de O Livro na Escola: Liberdade para Voar e Crescer, “transmite aqui todos os bons exemplos, aperfeiçoados pela prática, de como levar às crianças o discurso literário, expurgado de empatias negativas, acrescido de enfoques atraentes e válidos... que aproximam, em vez de repelirem, o leitor curioso e interessado que existe em todas as crianças”. Um texto informativo e eminentemente prático, relatando experiências, sugerindo atividades etc... de interesse para professores, estudantes, pais e mães – e até das próprias crianças, que podem aproveitar as “sugestões bibliográficas” (com faixa etária e tudo) no final do livro, que – como aliás também o de Nelly Novaes Coelho – traz também uma boa bibliografia comentada e um glossário.
O Conto de Fadas, de Nelly Novaes Coelho, Ed. Ática, Série Princípios. Nelly Novaes Coelho, cujo currículo não caberia nesta coluna, dispensa apresentações. Basta lembrar que ela é professora-titular de Literatura Portuguesa e de Literatura Infantil/Juvenil da USP e autora de muitos livros e inúmeras outras publicações, entre as quais o importantíssimo Literatura Infantil – História – Teoria – Análise e o monumental Dicionário Crítico da Literatura Infantil/Juvenil Brasileira – obras indispensáveis para professores, escritores e o interessados. O Conto de Fadas é desses pequenos livros, “maiores por dentro que por fora” – “uma viagem maravilhosa pelos caminhos labirínticos do Real e do Imaginário”, bem conhecidos da autora, que generosamente reparte seu saber com o leitor de maneira fácil e agradável (e até com um levíssimo toque “feminista” na medida que focaliza a maneira como a mulher é vista nas diversas épocas e etapas do maravilhoso).
Literatura Infantil – Voz de Criança, das professoras e ensaístas Maria José Palo e Maria Rosa D. Oliveira, Ed. Ática, da mesma Série Princípios, é “uma reflexão ampla sobre o tema”, num “estudo que não se restringe a uma crítica da visão tradicional...”. E que assume a defesa da criança como ser oprimido, com bastante erudição e muitos exemplos e ilustrações.
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